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Entrevista: Vanessa Giácomo se inspirou na avó para compor Malvina, em Gabriela

Luiza Dantas / Carta Z Notícias.

Os personagens rurais foram os mais marcantes na trajetória de Vanessa Giácomo até agora. Por outro lado, por incrível que pareça, é justamente a revolucionária Malvina da trama da Globo, Gabriela – ambientada no século passado. Trata-se do papel mais contemporâneo da atriz na televisão. Na história, a menina não aceita as determinações da sociedade machista da época e nem as imposições feitas às mulheres, tratadas como meros objetos de seus maridos e suas famílias. E sofre as consequências de deixar essa posição bem clara em suas atitudes e discurso.

" Vejo ela como uma mulher de hoje em dia inserida ali, naquele contexto. E, pelo que ouço das pessoas, acho que essa é a visão que a maioria tem dela”, pontua.

Acostumada a atuar em remakes – ela estreou em Cabocla e marcou presença também em Sinhá Moça e Paraíso -, Vanessa fez questão de buscar material da primeira versão, quando Elizabeth Savalla desempenhou o mesmo papel.

“Não é legal olhar. Ainda mais quando grandes atores fizeram o personagem. Você fica com aquela referência na cabeça. Se deixa influenciar por aquela imagem, aquele jeito de fazer", avalia.

O Fuxico – Como tem sido a reação do público com a Malvina?

Vanessa Giácomo – Nas ruas, todos sempre comentam que adoram a personagem, que ela representa bem a mulher revolucionária mesmo em uma época que esse público não viveu. As telespectadoras se identificam bastante porque o discurso dela é muito atual. E não é o caso de uma personagem que levanta bandeira à toa, ela sente tudo que diz. Sofre com a sociedade e os costumes daquele período. Por isso acho tão gostoso fazer esse tipo de personagem.

OF – Você já declarou que sua avó serviu de inspiração. Por quê?

VG – Minha avó era uma mulher muito forte, então acho que ela devia ser assim, como a Malvina. Foi uma mulher bem à frente do seu tempo e, com certeza, deve ter sofrido por conta disso. Ela sempre falava o que pensava para o meu avô. E a geração dela ainda era dessas mulheres que ficavam muito quietas, que passavam por cima das próprias vontades para fazer o que o marido achava prudente. Mas a minha avó, não. Meu avô era italiano, mas ela era impulsiva, dava bronca nos filhos, controlava as situações.

OF – Na primeira versão de “Gabriela”, a Malvina foi interpretada pela Elizabeth Savalla. Você chegou a conversar com ela sobre a personagem?

VG –  Sim, mas pela internet. Ela me mandou um e-mail muito fofo, desejando sorte nesse trabalho. Dizia que tinha sido uma personagem muito importante para ela e que esperava que também fosse para mim na minha carreira. Eu trabalhei com ela em Morde & Assopra, mas ainda não sabia que eu faria a Malvina.

OF – Que referências você buscou para compor a Malvina?

VG – Eu li o livro, decidi focar mesmo em Gabriela, Cravo e Canela. Depois, fui até Ilhéus e passei um tempo lá, por conta própria mesmo. Foi importante para me adaptar, sentir o ritmo da cidade e prestar atenção na prosódia. É claro que nos anos 1920 havia outro ritmo, mas dá para pegar um pouco do jeito do baiano, que já tem uma velocidade diferente. Tenho muitos amigos da Bahia também, o que me ajudou a encontrar o tom.

OF – Você diz que viajou até a cidade por conta própria, para entender melhor a obra de Jorge Amado. Faria isso por qualquer personagem ou esse tinha algo diferente?

VG – Bom, quando recebi o convite, vi que não era qualquer papel. A Malvina é uma personagem muito forte nessa história. E tem outro detalhe: é a minha primeira novela das 23 horas, nunca atuei nessa faixa de horário. O fato de ser uma adaptação de Jorge Amado já traz algo grandioso por trás dessa novela, então era importante me envolver, estudar a fundo e tentar entender a cabeça dele. Eu queria perceber como ele enxergava aquelas mulheres. Gabriela tem várias protagonistas e todas com personalidades fortes e diferentes. Além disso, não conhecia Ilhéus e tive curiosidade de ver como são aquelas pessoas. Olha, foi quase uma forma de pedir a bênção aos baianos.

OF  – Por que essa necessidade de pedir bênção?

VG – É que quando você faz um sotaque em qualquer trabalho, existe uma reação dos moradores. Alguns reclamam de exageros, outros encaram que há um deboche ali. Há uma linha tênue que separa o “fazer com verdade e o se preocupar mais com o sotaque do que com a essência do personagem”. Ao priorizar o sotaque, perde-se muito, a gente fica tão preso àquilo que deixa de ter atenção em outros detalhes. Claro que estudei o sotaque, pesquisei, mas uma vez que a melodia estava conhecida e entendida, pronto. Não ia ficar paranoica com aquilo.

OF – Você grava muitas cenas apanhando. Como são feitas essas sequências?

VG – Sempre tem gente da equipe de cenas de ação da emissora e de dublês que nos ajudam e ensinam a fazer. Se eu tomar um tapa do Chico Diaz, nossa, nem sei o que vai acontecer. Afinal, ele é um homem forte. Da Bel Kutner não tem problema, eu peço para dar de verdade. Mas com o Chico acho melhor ensaiar. Ainda não gravei a cena da grande surra descrita no livro, de quando o pai descobre que ela está com um homem que é casado e que, mesmo sabendo, ela continua. Essa, confesso, já estou me preparando psicologicamente para gravar. Mas esse detalhe é um diferencial bacana nesse trabalho, acho que me ajuda a fugir um pouco do que o público está acostumado a me ver fazendo.

OF – Você tinha a preocupação de ficar marcada de alguma forma na tevê?

VG–  Eu estreei em Cabocla e fiz parte de algumas novelas do Benedito Ruy Barbosa, que escreve tipos mais rurais. E não é novidade que, normalmente, quando a gente entra na televisão, durante muito tempo nosso primeiro personagem é a grande referência que as pessoas têm. Então, até mudar isso e mostrar que você pode fazer outras coisas, pode demorar.

OF – Para você, a Malvina ajuda a alterar essa imagem? Afinal, seus últimos papéis já foram de antagonista, em Paraíso e Morde & Assopra.

VG – Nunca penso demais nessas coisas quando começo um trabalho. É uma forma de proteção mesmo. Quando eu crio milhões de expectativas em cima de algo, começo a colocar um peso grande demais ali. Então, prefiro levar como um papel que é tão importante quanto qualquer outro que eu já tenha feito. Estudo ao máximo e faço do melhor jeito possível. E, na hora do ensaio, vejo como o outro vai fazer para responder bem. Estourar nunca foi prioridade na minha vida. E Morde & Assopra já foi uma novela que me mostrou de um jeito bem diferente: na comédia.

OF –  Você tinha vontade de fazer humor na tevê?

VG – Quando eu recebi o convite, minha primeira reação foi me questionar. Ficava pensando: “ah, jura? Mas eu não sou engraçada”. Não sabia como ia ser e tinha medo de ficar um mico. Eu, por exemplo, não sei contar piada. Quando chega no meio, logo me pergunto porque fui começar. Mas, nessas horas, o melhor é não tentar fazer muita graça. Mostrar o seu ridículo já é engraçado.

OF – Em Gabriela, você diz que valorizou o fato de ser uma novela na faixa das 23 horas. Por quê?

VG – Acho que é bem diferente para o currículo. Todo mundo conhece e sabe o que acontece nos capítulos. A repercussão é incrível. Os telespectadores de cada horário são diferentes. Fiz muitos trabalhos às 18 horas, que são mais assistidos pelas senhorinhas. Já às sete, muitas crianças veem. Todos são gostosos de fazer, mas é diferente quando você está mais tarde. Certos temas são tratados com mais liberdade.

OF –Gabriela é seu quarto remake na tevê, mas essa é a primeira vez que você interpreta um personagem que faz parte de uma adaptação literária em uma novela. De que forma isso influenciou seu trabalho?

VG – Eu achei maravilhoso. Já tinha lido o livro, mas reli agora porque não lembrava de certos detalhes. O diferente é que a gente pode ver a história toda sem ficar com aquela imagem impressa na mente. Você embarca na viagem do autor. E a minha visão da Malvina é exatamente o que estou fazendo no ar. Acho muito chato ser feminista gratuitamente, radicalizar. Faço sentindo. Se aquela mulher sofre consequências do comportamento daquela sociedade, cabe a mim explorar isso e mostrar verdade. O Walcyr fez uma adaptação bem legal. Nem tem tantas referências assim da Malvina no livro e ele trabalha bem a personalidade dela.

OF – Exceto uma participação nos primeiros capítulos de Duas Caras, todas as suas personagens foram de época ou tipos rurais. Sente falta de viver uma personagem mais contemporânea e urbana?

VG – Quando vejo personagens contemporâneos demais, sinto que pode faltar um tempero. Me assusta quando falam para mim sobre um papel muito parecido comigo. Será que vou saber fazer? Como vou criar esse ponto de distanciamento? Se é de época ou como agora, de um livro, fica mais fácil. Pode até ser igual a você, mas há detalhes que diferenciam. Personagens mais contemporâneos, aí eu não sei. Porém, ao mesmo tempo, vejo o trabalho do João Emanuel Carneiro, que não cria mocinhas que são só mocinhas e vilãs que fazem apenas maldades, e penso que pode ser interessante.

 Sorte de principiante

 Desde pequena, Vanessa era estimulada pela mãe a se interessar pela carreira artística. Tanto que ainda guarda alguns vídeos em que aparece atuando a pedido dela.
“Minha mãe falava: 'faz cara de brava, de chateada, de feliz…' e eu fazia. Isso até eu começar a virar mocinha, porque aí eu já ficava achando aquilo um mico e não estimulava”, lembra.
Mas a atriz confessa que sempre foi, como ela mesma se refere, aparecida. Nascida em Volta Redonda, no interior do Rio de Janeiro, ela coleciona histórias engraçadas por conta disso. Como em sua primeira apresentação de teatro, ainda aos 4 anos, quando deveria ficar no fundo do palco vestida de borboleta por não saber direito a coreografia de um número musical.
“Eu no fundo? Não, não mesmo. Eu estava sem as asas, então fui para a frente, arranquei as asas da minha prima, que também fazia a peça, e comecei a inventar uma dança. Tiveram de me tirar do palco, porque eu não queria sair”, recorda, às gargalhadas.

Começou a estudar interpretação aos 13 anos, mas só aos 18 os caminhos começaram a se abrir. Foi quando, com a ajuda do irmão e dos pais, se mudou para o Rio. Sem dinheiro para ter aulas em escolas de teatro mais reputadas, buscava trabalho, já que possuía o registro profissional de atriz. Foi aos 20 anos, por acaso, que veio a possibilidade de fazer um teste para a novela Cabocla. Na época, não sabia quase nada sobre a história, muito menos que buscavam nessa seleção a personagem-título. “Fiz o teste na sexta e já na segunda recebi a resposta. Quando o Ricardo Waddington me ligou, avisou que minha vida ia mudar e que eu seria a protagonista, conta.

 Nova cara

 Para interpretar Malvina, Vanessa cortou a franja e encurtou os fios de cabelo. Com isso, ganhou, como ela diz, “uma cara retrô”. A caracterização ajudou bastante na hora de compor a personagem, mas, por outro lado, dificulta a atriz na hora de se distanciar da estudante rebelde do livro de Jorge Amado.
"Fica mais difícil não parecer a Malvina o tempo todo. Por conta desse visual, meu armário precisou ficar diferente. Eu já me acostumei, mas assim que terminarem as gravações, vou colocar megahair”, assume.

 

Trajetória na TV

# "Cabocla" (Globo, 2004) – Zuca.

# "Sinhá Moça" (Globo, 2006) – Juliana.

# "Amazônia, de Galvez a Chico Mendes" (Globo, 2007) – Ilza (Ilzamar Mendes).

# "Duas Caras" (Globo, 2007) – Luciana.

# "Paraíso" (Globo, 2009) – Rosa.

# "Morde & Assopra" (Globo, 2011) – Celeste.

# "Gabriela" (Globo, 2012) – Malvina.


Gabriela – de terça a sexta, às 23 h, na Globo.

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