Gabriel Vicente sobre ser o Eric no musical ‘A Pequena Sereia’: ‘Que crianças pretas se vejam em mim’

Por - 27/06/22

Gabriel VicenteDivulgação/Gabriel Bentoncel

Os fãs de teatro musical já tem um compromisso marcado na agenda. No dia 17 de julho estreia o musical “A Pequena Sereia“, no Teatro Santander, em São Paulo.

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O espetáculo é baseado na clássica história da Disney, em que a sereia Ariel desafia tudo e todos para poder realizar seu sonho de se tornar humana. Dando vida à sereia mais amada dos sete mares está Fabi Bang, que já interpretou a personagem em outra montagem do musical, em 2018.

A surpresa está por conta do intérprete do Príncipe Eric. Gabriel Vicente se prepara para viver o personagem nos palcos e carrega a imensa alegria e responsabilidade de ser o segundo príncipe negro no Brasil, dentro de um título Disney, dando continuidade ao lindo trabalho de Tiago Barbosa, que viveu o Príncipe Topher em “Cinderela”.

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Em entrevista exclusiva para o OFuxico, o ator comentou como foi receber a notícia de que daria vida ao personagem tão amado pelo público.

“A reposta já estava no meu whatsapp a cerca de três horas, era fim do pré-carnaval… E eu estava sem bateria todo esse tempo. Foi uma surpresa deliciosa. Em seguida vim para São Paulo nessa mesma noite, e fiquei pensando muito sobre tudo que isso significa. É um título muito especial, é Disney né!? Faz parte da minha criação, e de forma geral, está no imaginário afetivo do brasileiro. Desbravar fronteiras, e ter a chance de representar crianças que talvez nunca tenham se visto nesse tipo de personagem, é sem dúvidas a minha maior alegria”, disse ele.

Gabriel Vicente interpreta Príncipe Eric no musical A Pequena Sereia
Gabriel Vicente interpreta Príncipe Eric no musical A Pequena Sereia – Foto: Reprodução/Instagram/@cenamusical

O artista também comentou sobre a grande responsabilidade de interpretar Príncipe Eric. “Eu vou pelo caminho do amor em estar em um lugar tão especial, fazendo a arte e vivendo dela, que esse sim é um grande desafio. A responsabilidade é a de sempre, muito empenho para entregar o melhor possível para cada plateia, para cada fã desse universo”.

No clássico desenho da Disney, o Príncipe Eric é branco e de olhos azuis. No entanto, Gabriel garantiu que confia no seu talento e não teme receber comentários maldosos.

“Estou perto de completar vinte e oito anos, e ao longo deles todos criei forças e base através do estudo, da profissão, da conexão com a espiritualidade para conviver com o racismo, que é tão estrutural, que está em todos os lugares. Digo isso porque não sinto medo. Eu estou vivo, faço arte e vivo dela desde os quinze anos, e tenho força para seguir minha caminhada, enfrentando o que for preciso, para que entendam que eu estou aqui. É preciso que entendam, que por trás de uma produção grandiosa como essa, existe uma equipe criativa da mais alta competência, que sabe exatamente o material humano que precisam para cada personagem e eu confio neles por terem confiado em mim”, afirmou.

Na entrevista, Gabriel falou da importância da representatividade nos palcos. “Eu nunca me imaginei como príncipe, é novo para mim ainda e eu espero poder criar alguma perspectiva de sonho, na proporção de príncipes e princesas, reinos e finais felizes, para que crianças pretas se vejam um pouco em mim”.

Para viver o famoso personagem, o artista ensaia oito horas por dia junto com o restante do elenco. “Os ensaios são de oito horas por dia, sete vezes por semana. É uma academia do corpo e da voz, então o tempo livre tem sido para descanso físico e mental, que é fundamental. Treinei correndo e cantando as músicas, que são de notas muito agudas e longas, mas agora os ensaios consomem todo tempo. Estamos perto da entrada no palco, e novos desafios chegam todos os dias”.

A produção fica em cartaz até o dia 16 de outubro.

RACISMO

Infelizmente, como a maioria das pessoas pretas, Gabriel teve que aprender a lidar com o racismo desde muito cedo. “É claro que sendo um preto de pele clara, minhas experiências com racismo são muito mais brandas do que colegas retintos, mas é muito curioso quando me perguntam isso, porque… Parece que são casos isolados, mas na verdade; o mundo não te deixa esquecer que é preto nem um minuto porque isso está na sua história, está no olhar que cada pessoa te direciona e quando você vê um olhar para um branco e nota que para você foi diferente, você nem sabe exatamente porque, mas aquilo te atravessa e te muda. Te prepara, te obrigado a ser mais forte, mais competente”.

Na entrevista, o artista relembrou um episódio de racismo que sofreu ainda quando era criança. “As perseguições por seguranças nos supermercados, e as portas giratórias de bancos, são meu maior trauma e fonte de grande raiva. Quando eu era pequeno, lembro da primeira vez que me deparei com o racismo, e entendi que algo aconteceu, e que me feriu. Estava no Ceasa com minha avó materna, que foi quem me criou. Importante frisar que eu só me criei com minha família materna, que é branca… A parte preta da minha família é toda paterna. Estávamos no Ceasa, já dentro do carro para ir embora, e estava chovendo. Minha avó se deu conta de que não tinha pago o bilhete do estacionamento, e me pediu para correr e fazer isso, enquanto ela me esperava na frente do guichê. Eu fui, paguei, e voltei correndo”, começou ele.

Em seguida, Gabriel contou que o segurança do local achou que ele iria roubar o carro, apenas pela cor da sua pele. “A corrida foi seguida por um apito, e eu via minha avó acenando de dentro do carro, e eu não entendia muito bem. Quando entrei no carro, ela estava revoltada, de um jeito que nunca tinha visto, e ela desceu para confrontar o rapaz do apito. Ela me explicou que ele pensou que eu fosse roubar o carro, e estava alertando para ela partir antes que eu chegasse até ela. E me disse sem filtro, que ele tinha pensado isso porque eu era ‘pretinho'”.

Mesmo depois de anos do ocorrido, o caso ainda gera dor. “É muito dolorido, é uma ousadia sem fim o que fazem. E também diz tanto sobre a estrutura econômica do nosso país de hoje, pela construção, a cerca de muito racismo, de apagamento de histórias e povos. Já sofri racismo, eu sofro racismo e o Brasil, ainda é um país muito racista”.

NOVOS PROJETOS

Ainda este ano, Gabriel Vicente poderá ser visto em um filme da Netflix. O ator ainda não pode revelar o título, mas adiantou um pouco o que o público pode esperar.

“É uma participação em um longa muito especial na Netflix, uma comédia romântica muito legal, com um elenco maravilhoso, e que me despertou um desejo imenso de viver mais histórias no audiovisual, uma linguagem encantadora”, afirmou.

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