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Samara Felippo relata caso de racismo sofrido pela filha

Reprodução/Instagram

Branca, mãe de duas meninas negras. Samara Felippo sempre fez questão de mostrar às filhas, Alicia e Lara – fruto de seu relacionamento com o jogador de basquete Leandrinho – que elas devem se orgulhar de serem exatamente como são. Sem distinção de absolutamente nada. Mas nem sempre a atriz de 41 anos consegue driblar as adversidades, neste caso, maquiada de racismo.

A atriz contou em suas redes sociais que Alícia, de 10 anos, foi alvo de xingamentos e demonstrações explícitas de racismo durante a formatura na escola.

Em um longo desabafo, a carioca destacou que a maternidade de duas meninas negras lhe mostrou um mundo que desconhecia. E contou que a filha foi duramente xingada por um grupo de adolescentes.

"Garotos brancos de 14 anos, classe média de merda, com a camisa verde e amarela, que descobri que um deles é filho de miliciano", detalhou.

Inconformada com o que viu e ouviu, a atriz saiu em defesa da filha.

"Agradeço ao que me fez sair da minha bolha branca e ter desde cedo esclarecido minha filha, enaltecido sua esperteza, beleza, coragem, seu cabelo, sua pele, suas raízes…e feito ela sair dessa situação de cabeça erguida e fortalecida", escreveu.

Leia o desabafo da atriz, na íntegra:

"Ser mãe de duas meninas negras me abriu pra um mundo eu onde eu descobri que não sabia nada. Não sabia sequer enxergar a dor do outro. Onde eu enxerguei privilégios por ser uma mulher branca numa sociedade tão racista." Esse é um trecho de uma fala minha na peça Mulheres Que Nasceram Com os Filhos, que num dia de ensaio me veio aos prantos. Eu sempre falo, escrevo mas nunca tinha passado com minhas filhas por uma situação de racismo. E pela primeira vez me deparei diretamente com o que muitos passam DIARIAMENTE.

Estávamos na festa de formatura da Alícia, enquanto os pais conversavam no salão de festas as crianças brincavam no parquinho ao lado. Quando uma delas veio até a mãe: "Mae, tem dois adolescentes zoando e implicando com a gente". Eu imediatamente levantei e fui a passos largos. As crianças relatavam: "Aqueles três, puxaram o cabelo do fulano, zoaram com a ciclana". Meu sangue começou a entrar em ebulição, fui que nem um bicho pra cima dos moleques e falei tudo que tenho vontade pra racistas, mesmo os ainda nem sabem que são. Garotos brancos de 14 anos, classe média de merda, com a camisa verde e amarela, que descobri que um deles é filho de miliciano. Os xingamentos para minha filha eram: marrenta, neguinha e cabelo ruim.

O clássico do racismo naturalizado. Agradeço ao que me fez sair da minha bolha branca e ter desde cedo esclarecido minha filha, enaltecido sua esperteza, beleza, coragem, seu cabelo, sua pele, suas raízes…e feito ela sair dessa situação de cabeça erguida e fortalecida. E assim continuo fazendo. Sei que não será a primeira e nem última vez que ela passará por isso. Agora eu te pergunto: se eu como mulher branca, cheia de privilégios, minhas filhas negras, mas ainda sim com seus privilégios, seja por classe social ou tom de pele (Sim, tom de pele conta nesse país! Quanto mais preta a pele mais preconceito sofre-se, leia sobre Colorismo) passamos por isso, imagina quantas meninas pretas passam todos os dias? Te pergunto: se eu mulher branca estou até agora chorando sozinha, com ódio e raiva, querendo esfolar a cara daqueles moleques e os pais deles, como não validar e enxergar a raiva e ódio de SÉCULOS de humilhação e violência? Acordem!"

 

Entendendo o racismo

Parece fácil explicar, mas não é. Racismo é a denominação da discriminação e do preconceito (direta ou indiretamente) contra indivíduos ou grupos por causa de sua etnia ou cor. O preconceito é uma forma de conceito ou juízo formulado sem qualquer conhecimento prévio do assunto tratado, enquanto a discriminação é o ato de separar, excluir ou diferenciar pessoas ou objetos.

Preconceito é uma coisa. Racismo é outra. O preconceito pode advir de várias outras diferenças, como gênero, local de origem e orientação sexual. Já o racismo é uma forma de preconceito e, como as outras formas, manifesta-se de diversas maneiras, fazendo vítimas todos os dias.

E isso se divide em várias vertentes. Veja só:

Preconceito e discriminação racial ou crime de ódio racial

Forma direta de racismo. Manifesta-se de forma violenta física ou verbalmente contra outros indivíduos ou grupos por conta da etnia, raça ou cor, bem como nega acesso a serviços básicos (ou não) e a locais pelos mesmos motivos. Nesse caso, a lei 7716, de 1989, do Código Penal brasileiro prevê punições a quem praticar tal crime.

Racismo institucional

Forma indireta. É a manifestação de preconceito por parte de instituições públicas ou privadas, do Estado e das leis que promovem a exclusão ou o preconceito racial. Um clássico e doloroso exemplo é a forma de abordagem de policiais contra negros, que tendem a ser mais agressivas. Se você assistiu à série Olhos Que Condenam, na Netflix, é exatamente aquilo ali.

Racismo estrutural

De maneira ainda mais branda e por muito tempo imperceptível, essa forma de racismo tende a ser ainda mais perigosa por ser de difícil percepção. É um conjunto de práticas, hábitos, situações e falas embutido em nossos costumes e que promove, direta ou indiretamente, a segregação ou o preconceito racial. Para te ajudar a entender melhor: negros e indígenas raramente tinham acesso aos cursos superiores de Medicina no Brasil. Antes da lei de cotas, era raríssimo. A população negra estava relacionada, em sua maioria, à falta de acesso à escolaridade, à pobreza e à exclusão social.

Outro exemplo do racismo estrutural está nas nossas falas e hábitos pejorativos incorporados ao cotidiano. E muitas vezes exercemos o racismo estrutural involuntariamente. Eu mesma, negra que sou, só descobri que a palavra denegrir é totalmente racista quando passei a escrever para o público negro, numa revista especializada. O que é denegria a imagem de alguém? É tornar negro. E isso é feio, é ruim? Sem falar nas piadas que associam negros e indígenas a situações vexatórias, degradantes ou criminosas ou quando desconfiamos da índole de alguém por sua cor de pele. Outra forma de racismo estrutural muito praticado, mesmo sem intenção ofensiva, é a adoção de eufemismos para se referir a nós como as palavras "moreno", "pessoa de cor", "mulata". Não pense que está suavizando… não está!

Causas do racismo

A discriminação pela origem pode ser reportada desde a Antiguidade, quando povos gregos e latinos classificavam os estrangeiros como bárbaros. A origem da designação do preconceito de raça, em específico, é mais nova, tendo sido alavancada nos séculos XVI e XVII pela expansão marítima e colonização do continente americano. O domínio do "novo mundo", o genocídio dos povos nativos e a escravização de povos africanos geraram um movimento de tenta tiva de justificação de tais relações de poder por uma suposta hierarquia das raças.

Os europeus consideravam que povos de origem europeia nata seriam mais inteligentes e capazes para dominar e prosperar, enquanto os negros e indígenas foram, por muitas vezes, considerados animais.

No século XIX, com o impulso positivista sobre as ciências, teorias científicas racistas surgiram para tentar hierarquizar as raças e provar a superioridade da raça branca pura.

O nazismo alemão e entidades como a Klu Klux Klan, nos Estados Unidos, utilizaram e utilizam teorias raciais ultrapassadas – como a medição do crânio – para justificar a supremacia da raça branca.

Não esqueça: o crime de racismo está previsto na Lei n. 7.716/1989, é inafiançável e imprescritível. A pena varia entre 1 a 5 anos de prisão, de acordo com o caso.

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